nuno ramos, em ó, fala da prisão da produtividade, do pequeno demônio que grita em nós o tempo todo: aproveite o tempo, concentre-se, estude, ganhe dinheiro. ele diz que, nesses imperativos, uma produtividade difusa, a constância de propósitos e a fuga de qualquer dissipação, faz de casanova ou ford funcionários de um mesmo patrão. ele diz que admira quem responde a fatídica pergunta: o que tem feito? com um não sei ou um nada ou nem sequer responda, absorto em outra coisa.




as hidrelétricas unificam num único motor, inúmeras possibilidades físicas e simbólicas, do mundo natural, produzindo inevitavelmente um excesso de energia nessa canalização forçada. a energia de uma usina não é gerada pelas águas ao mover as turbinas imensas, mas é antes o resultado natural e inevitável da restrição simbólica, feita a ferro e fogo, por séculos e séculos, de tantas possibilidades e metáforas – da transformação de uma força absolutamente ambígua (a água) no combustível desencantado da engrenagem de um motor. é este radical empobrecimento poético daquilo que pode estar aprisionado na água que efetivamente produz a eletricidade.